Wednesday, July 06, 2011

Conjunções Disjuntivas

Caspar David Friedrich - O viajante sobre o mar de névoa (1818)





Para acompanhar a beleza deste quadro de Friedrich, sugiro-vos um excerto de Virgílio Ferreira da sua obra Aparição. Se com os seus quadros Friedrich provoca a fragmentação do olhar panoramático e neutro do real, porquanto nos faz confrontar com esse real aparentemente ensimesmado numa diferença de si como a contrapartida de um ver «romântico», Vergílio Ferreira eleva esse olhar sem uma visibilidade do real que lhe garanta serenidade a uma vibração inquietante. Merecem que nos demoremos, naveguemos naquilo que nos oferecem.

"Quem te habitava não é. Viverás ainda na memória dos que te conheceram. Depois esses hão-de morrer. Depois serás exactamente um nada, como se não tivesses nascido. Quantos crimes, vexames, remorsos, alegrias e projectos e traições e castigos e prémios e tudo e tudo nos milhões de homens que passaram noutros séculos por esta pequena aldeia e souberam os seus sítios e a montanha e a ribeira e se souberam daqui e disseram «esta casa é minha, esta terra é minha» e sentiram a aura de tudo isto, destes ventos, destas noites, e são hoje o nada integral, absoluto, pura ausência, nada-nada? Eis que começa a tua longa viagem para a vertigem das eras, para a desaparição do silêncio dos milénios."